Japão: tragédia e reconstrução I
Na tarde do dia 11 de março, exatamente às 14:46 h, 2:46 h para nós, brasileiros (horário de Brasília), o Japão sofreu o mais forte terremoto na sua história (8,9 graus de magnitude na escala Richter), desde que se iniciaram os registros sismológicos naquele país em fins do século XIX. Ao terremoto – ocorrido em alto-mar, a nordeste do arquipélago, 370 km de Tóquio – seguiram-se ondas de tsunami – a terrível onda que chegou ao continente com efeitos devastadores. Ao chegar, trazem do mar embarcações varrendo também o que encontram no litoral, depositando-as terra adentro, às vezes, quilômetros longe da praia. Ao se recolherem, levam para o mar mais do que trouxeram: casas, carros, pessoas, animais, árvores, barcos e qualquer objeto sujeito à força das águas. Os japoneses dizem temer mais o tsunami do que o terremoto.
A tragédia fez o Japão enterrar seus milhares de mortos às dezenas em valas comuns, assistidos apenas pelos soldados do Exército e alguns familiares. País onde a cremação é a tradição – processo insuficiente para solução em larga escala – foi também prejudicado pela falta de energia elétrica.
“O Japão tem mais de cem milhões de habitantes e não houve até agora nenhum saque” noticiaram a Bandeirantes, a Globo e a CNN. “Por aqui, veem-se vários homens do Exército no socorro às vítimas, mas todos eles trabalham desarmados”, noticiou também a CNN em outro dia.
E continua a imprensa estrangeira: os supermercados ficaram de prateleiras vazias vendendo tudo sem qualquer aumento; ao racionamento de compra de água decidido pelos comerciantes, houve quem levasse menos do que o permitido, alegando que poderia fazer falta a outro; no racionamento de gasolina, houve postos que encerraram as vendas a particulares e destinaram o combustível restante para ambulâncias e veículos de resgate. Nada disso foi notícia na TV local. A imprensa estrangeira parece não acreditar na aparente calma dos japoneses.
A TV japonesa NHK no entanto, informa com outro foco: noticia num dia, grupo de colegiais que rumou no fim de semana em ônibus fretado para os locais afetados para ajudar na arrumação das casas – preferencialmente de idosos – desobstruindo passagens, fazendo o serviço de limpeza e arrumação mais pesado e num outro, crianças do primário levados pelos professores para massagear os ombros dos idosos nos abrigos; banhos públicos que franquearam a entrada para desabrigados; hotéis que disponibilizaram parte das vagas para socorro às vítimas; atletas e artistas que recolhem fundos nas ruas.
A natureza não é apenas agressiva, mas cruel com os japoneses: o arquipélago se situa no Círculo de Fogo do Pacífico, onde ocorrem 80% dos terremotos, na confluência de quatro placas tectônicas: da Plataforma do Pacífico, das Filipinas, da Euro-asiática e da Norte-americana, onde 54 vulcões estão ativos e sofrem 20% dos terremotos mais violentos do planeta. É também rota de vendavais e furacões vindos do sul e sudeste do Oceano Pacífico. Essas constantes manifestações de agressividade da natureza, que parece não desejar a ocupação do arquipélago pelo homem, parece ter incrustado na genética do povo japonês a natural ajuda ao próximo como requisito para sobrevivência de sua gente.
Sem petróleo, ouro, manganês, diamante ou qualquer outra riqueza mineral e sem terras agricultáveis suficientes para alimentar sua população – o arquipélago é apenas um amontoado de mais de 3 mil ilhas, 70% ocupados por florestas montanhescas – o Japão tem apenas japoneses: 128 milhões que se espremem nos restantes 30%.
Diz-se no Japão, diante de qualquer catástrofe que atinja o país ou a comunidade – “faça o que você pode fazer”. “Do what you can do”. Sem a força enfática e auto-sugestiva do “yes, we can” (sim, nós podemos), slogan de campanha do norte-americano Barack Obama, o japonês, em meio à sua simples praticidade deseja apenas devolver à nação um país reconstruído. E todos trabalham para isso.
País que vivia numa estrutura feudal há pouco mais de cem anos, isolado do mundo, modernizou-se rapidamente e adequou suas instituições integrando-se ao mundo moderno. Na última grande catástrofe, quando viu seu país – já depauperado pela Segunda Guerra – ser bombardeado por duas bombas atômicas, a nação se reergueu “fazendo o que cada um podia fazer pelo seu país” e, ajudado por outros países, em menos de 30 anos era a segunda potência econômica do mundo.
O episódio de 11 de março novamente exigirá desse povo, força, determinação e grande espírito de sacrifício. Como dizem os japoneses: “a situação é excepcional, por isso, exigirá também esforço excepcional”. E na visão de um observador brasileiro: ” a cultura desse povo reconstruirá o país”.
Uma vez mais com o apoio de vários países, aí incluída a força de trabalho de mais de 300 mil brasileiros que lá residem, nós, os brasileiros daqui, acreditamos e desejamos profundamente, que o Japão breve se reerga dos escombros.
Não apenas “Gambare, Nippon” (força, Japão), mas
Minna gambarou! (esforcemo-nos todos).